O "Café do Geléia", fundado por Giovanni Di PaZZo, começou como um pequeno café na esquina da rua Orlontis com a rua Coronel Verde. Servindo apenas poucas variações do simples café o lugar foi ganhando fama devido ao seu ambiente altamente aconchegante contendo fotos de viagens feitas pelo "Geléia" (apelido carinhoso de Giovanni), relíquias e artefatos adquiridos em suas diversas aventuras pelo mundo em busca do melhor café que existia. Certo ano, Giovanni conseguiu por métodos misteriosos o melhor café que os que ali passavam já haviam provado e começou a plantá-lo e serví-lo em seu pouco famoso "Café do Geléia". O lugar ganhou fama pelo seu café fabuloso e pelo ambiente que sugeria um conto de histórias entre amigos. Agora vivemos estas histórias... Bem vindos ao "Café do Geléia".

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Apartamento

            A moradia. O ser humano busca lugares para viver desde que a memória do mundo pode se lembrar. Nossas casas já foram cavernas, árvores, tocas, buracos, cabanas de palha, paredes de pedra, telhados de palha e diversas outras utilizando diversos recursos naturais ou manufaturados, mas todos eram para acomodar a tribo, o clã ou a família. Mais recentemente a moradia tem ficado muito popular na forma de apartamentos.
            Antes visto como um tipo de moradia digno apenas dos centros das cidades, com o crescimento populacional o apartamento tem se tornado cada vez mais a moradia comum da vida na cidade, seja perto ou longe de seu centro. Recentemente o Artista tinha comprado um apartamento. Por diversas questões, se mudou de uma casa gigante deixada pela família, para um apartamento bem próximo do Café do Geleia. Ele não podia ter se arrependido mais.
            Um dia, quando voltava de um "freela" que conseguiu em um estúdio, o Artista parou no portão de seu prédio novo e o aguardou ser aberto. Estava cansado e esperou o que parecia ser uma eternidade até que o porteiro ligou o interfone:
            - Pois não?
            Com um suspiro e olhos apertados o jovem respondeu:
            - Eu sou do 102...
            Deu mais um tempo e então o portão abriu. Ele entrou, olhou para a portaria, não viu nada, mas ainda assim acenou e desejou boa noite. O porteiro saiu e começou a pedir desculpas porque ainda não tinha se acostumado e tal. O Artista apenas sorriu e disse que não tinha problema algum. Continuou seu trajeto.
            Chegou ao saguão e quase tropeçou no degrau que ele não lembrava que existia. Apertou o botão do elevador. Os dois estavam no 20º andar e demorariam a descer. Ele estava cansado demais para subir dez andares de escada e preferiu esperar mesmo. Um dos elevadores indicou a seta para baixo e não desceu. Apenas depois de uma aparente discussão entre os elevadores um deles decidiu fazer a viagem. Quando ele chegou, o artista logo entrou e apertou o botão para o 10º andar. A porta se fechou demoradamente por causa das molas novas e, depois de fechada, as portas automáticas também se fecharam, mas abriram logo depois.
            O Artista estranhou e apertou de novo o seu andar. Mesmo procedimento: fecha, abre, fecha, abre. Tentou mais uma vez em uma inocente esperança. Nada. O porteiro veio e informou que provavelmente o elevador estava com defeito, pois outros moradores tiveram o mesmo problema. Sorrindo forçadamente o Artista encarou as escadas com um desespero óbvio. Suspirou, ajeitou a mochila nos ombros e deu o primeiro de muitos passos.
            Na metade do caminho ele já estava torcendo para chegar logo, ser abduzido, morrer ou ganhar superpoderes, tudo para acabar logo com aquele sofrimento. Percebeu que queria ir ao banheiro no caminho e isso lhe deu um leve aumento de adrenalina que ajudou na ascensão que estava à sua frente. Isso terminou em dois lances de escada e seu desespero aumentava com cada passo. Seu joelho estalava, sua coxa doía, e seu cérebro parecia estar desistindo de tudo. Finalmente chegando ao seu andar ele sorriu de forma cansada. Em sua mente um sorriso largo era demonstrado, no mundo físico apenas um sorriso torto e duvidoso era exibido em seu rosto suado. Viu a porta de seu lar e a abriu.
            Quando entrou, sua porta já bateu em uma encomenda que chegara dias atrás e ele ainda não tinha achado um espaço para colocá-la. Espaço. Espaço era um de seus maiores problemas atualmente. Mal fechou a porta e já correu para o banheiro onde se aliviou depois de bater na pia, lavou as mãos e saiu depois de bater a porta no próprio pé. Era hora de matar a fome que estava sentindo há horas, então foi até a geladeira e a abriu, deixando cair pelo menos dois “tupperwares”. Suspirando e massageando as têmporas para não explodir de estresse, ele os recolheu e pegou a sua refeição. Quando começou a prepará-la, não tinha uma coisa que ele pegasse que não derrubava outra. Ele pegava o saleiro e derrubava o pimenteiro; ia alcançar o azeite e derrubava o vinagre. Para alcançar o queijo no fundo da geladeira, só tirando a manteiga da frente e isso tudo sempre tendo que desviar das cadeiras e da mesa que ocupavam 80% de sua cozinha. Quando finalmente preparou sua refeição, percebeu que a mesa estava cheia de outras coisas e foi comer na sala. Tropeçou em seu gato no caminho e pensou que derrubaria sua tão esperada comida no chão, mas não foi esse o caso. Só derramou um pouco de refrigerante.
            Se sentou na mesa e começou a comer assistindo seus desenhos favoritos. O vizinho do lado começou a brigar com a namorada, e o Artista foi obrigado a aumentar um pouco o volume. No andar de cima vivia um cachorro e um garoto e eles acharam que o horário era propício para correr de lá pra cá fazendo bastante barulho, quase que como um esforço para irritar alguém. O volume foi aumentado de novo, e o Artista logo não ouvia os próprios pensamentos. Além de acordar cedo com reformas no andar de cima, ele não podia assistir TV em paz sem ficar surdo no processo. Continuou assistindo sem entender muita coisa e quando percebeu, tinha terminado seu jantar e estava olhando catatônico para um programa que ele não estava entendendo, pois o mundo estava atrapalhando (como sempre). Desligou a TV e foi tomar um banho. Quem sabe isso não melhoraria seu dia?
            Depois de bater na pia pela terceira vez no dia ele entrou no box e ligou o seu amado chuveiro. Sua água não veio. Nem naquela hora e nem depois de algumas tentativas. Ligou para a portaria e perguntou se tinha algo de errado já que tinha acabado de cozinhar e utilizou a água da torneira. O zelador disse que devia ter algum problema na caixa ou nas bombas e que iria verificar o mais rápido possível. "O mais rápido possível" provavelmente queria dizer "quando eu quiser", pois a água voltou apenas uma hora depois. Um banho em que uma pessoa mal tem espaço para levantar os braços e lavar as axilas, mas um banho.



            De banho tomado e deitado em sua cama lendo, era difícil se concentrar, pois mesmo no 10º andar o barulho da rua era muito. O Artista pensava se ia se acostumar com essa vida de cubículo, sem lugar para nada e pagando por serviços ruins. Cansou-se de pensar e lembrou que tinha que apagar a luz. Ao mesmo tempo que reclamava do espaço, seu cansaço fazia o interruptor parecer tão longe...

"Quando finalmente preparou sua refeição, percebeu que a mesa estava cheia de outras coisas e foi comer na sala."

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Videogames

            Entretenimento é algo que todos precisam. Nenhum ser humano, por mais workaholic que seja, consegue passar a vida sem precisar de um entretenimento. Uma palavra muito diversa que pode se referir a leitura, cinema, televisão, quadrinhos, esportes, música, desenho e, como dito no título: Videogames.
            Faz um tempo que Geleia tinha comprado uma máquina de fliperama para o café. A ideia era que o aparato combinasse com a jukebox ainda funcional e o jogo de pinball, meio abandonado em um canto do estabelecimento. Essa era a ideia. Mal sabia ele que tantos de seus costumeiros clientes se interessariam pelo jogo dentro da maquina. Menino Ottis passava horas a fio jogando ao lado de K.D., Gregório e Thelma.
            - Usa bola de fogo, Ottis! - Gritava Gregório enquanto movimentava sem parar o seu personagem pela tela.
            - O bicho voa! Precisamos de outra estratégia!
            - Estratégia? A minha é espancar essa harpia sem parar! - K.D. mordia o lábio inferior.
            - Ai, gente, distraiam o monstro pra eu furar as costas dele! - Thelma parecia a mais calma jogando, embora seu interior fosse pura fúria.
            Enquanto os sons digitais de espadas, explosões e gritos ecoavam pelo café, um casal entrou no estabelecimento e foi direto ao balcão.
            - Boa tarde! - Geleia, como sempre, soava amigável.
            - Boa tarde. Dois expressos, por favor. - O homem pediu e logo se voltou para conversar com sua mulher.
            Ottis bateu no console gritando um sonoro palavrão e foi correndo ao balcão, deixando dinheiro nele e pedindo mais fichas para Geleia, que as tirou do bolso e entregou para o garoto.
            - Cadê aquele elfo desgraçado? - Ottis falou logo depois de colocar as fichas.
            - Dando um pau na gente! - Bradou Thelma enquanto seu personagem morria de novo.
            O casal de senhores tinham olhares preocupados na direção das crianças e quando Geleia trouxe o pedido eles não hesitaram em perguntar:
            - Onde estão os pais dessas crianças?
            Geleia abriu a boca para falar mas percebeu que ele mesmo não sabia a resposta, então apenas enrolou.
            - Estão chegando em breve.
            - Você não deveria proibir estas crianças de jogar esse tipo de coisa no seu estabelecimento? - perguntou a mulher.
            Geleia ficou confuso.
            - Deveria?
            A mulher levantou os ombros, como alguém que acabou de dizer algo óbvio.
            - Claro! Este tipo de jogo não foi feito para crianças.
            Geleia tinha certeza de que os jovens eram o publico alvo.
            - Toma essa seu orelhudo, maledeto! - gritou K.D. depois de matar o elfo com uma espada secreta.
            - Ei! Veja se tem mais armas violentas assim em outras telas! Quero uma também! - Gritou Thelma pedindo para K.D. e Gregório olharem na internet.
            Geleia terminou os pedidos do casal e os colocou no balcão enquanto os senhores se voltavam para o mesmo com olhares que misturavam tristeza e raiva.
            - Estão agressivos! - Reclamou a senhora antes de bebericar seu café.
            - E falando palavrões! Xingando em alto e bom som! - Continuou o senhor enquanto testava a temperatura de sua bebida.
            Ao fundo Geleia pôde ver o Artista chegando, olhando o jogo dos garotos e dando dicas antes de chegar com um sorriso no balcão, onde deixou sua mochila.
            - E aí, Geleia! O de sempre por favor. - Falou ainda com o sorriso.
            Quando o Artista percebeu os velhos ao seu lado, ele ficou quieto e seu sorriso diminui muito para dar espaço a uma expressão franzida. Eles o olhavam com reprovação.
            - Como você pode apoiar uma coisa dessas? - A senhora perguntou ao Artista.
            - Perdão? - Ele parecia confuso.
            - Você deveria ser um exemplo, não deveria deixar crianças jogarem jogos como aqueles! - O senhor disse apontando para o fliperama.
            Ottis deu um soco em K.D., que riu.
            - Dá para parar de explodir meu personagem com essas magias?
            - Galera! Ainda tem demônios nos atacando! - Gregório estava preocupado.
            O Artista quase gargalhou.
            - Olha... Se essas crianças não jogarem isso o que elas jogariam?
            O senhor começou a falar como os garotos poderiam jogar futebol nas ruas ou em quadras e também como poderiam se divertir fazendo mais esportes e coisas do tipo. A senhora estava indignada com Thelma e começou a reclamar sobre como uma garota não deveria dizer tantos palavrões e como ela deveria se comportar mais como "uma boa moça".
            O Artista sorriu com o canto da boca e bebeu um gole de seu Gelaccino.
            - Essas crianças aprontam várias além desse jogo! Isso é só uma válvula de escape para os problemas do dia-a-dia... Eles crescerão como qualquer outra criança.
            O casal parecia impressionado.
            - Isso se não se juntarem a algum culto satanista usando drogas! - A senhora falou.
            O Artista gargalhou e Geleia quase o acompanhou ouvindo a senhora.
            - Vai ver o problema desses jogos estão em pessoas limitadas que nunca os jogaram na vida, não acha, minha senhora? - O Artista a encarou enquanto fazia barulho ao beber. - Você deveria experimentar. Pode fazer você se livrar de toda essa personalidade reprimida. - Concluiu sério.
            Os senhores pagaram a conta e logo saíram. Insultados, claro.


            Depois de mais algumas jogadas os garotos voltaram ao balcão com caras felizes.
            - Conseguiram terminar o jogo? - Perguntou o Artista.
            - Não - começou K.D. - Nós morremos... Mas agora sabemos como passar de tela mais rápido! - o grupo todo concordou.
            E eles foram para uma mesa rir e discutir sobre a aventura enquanto dividiam refrigerantes e salgadinhos.
            O Artista se virou para Geleia.
            - Acho que fiz você perder uns clientes hoje... Sinto muito.
            O gerente sorriu, como sempre.
            - Prefiro perder clientes do que ganhar pessoas reclamando da minha gerência.
            Os dois riram.

"Essas crianças aprontam várias além desse jogo!"

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

A Cova


            Tive um sonho. Não foi esses dias ou a pouquinho tempo. Tive o mesmo sonho de novo, um sonho recorrente que, por mais que seja sonho me atormenta na vida real e esmaga minha alma como uma prensa... Uma prensa que aos poucos uma entidade ou sentimento desconhecido vai apertando e apertando.
            Eu estou andando. Geralmente meus sonhos começam assim. Eu ando ou corro, geralmente de algo ou alguém e isso é terrível. Eu estou me vendo. Sonhos em terceira pessoa são meus favoritos pois não passam de filme sobre você. Você vê toda a ação e sente ela na pele, mas inconscientemente (por que é do inconsciente que tudo se trata) você sabe que é só um sonho e nada daquilo realmente está acontecendo. Estou andando em um grande campo gramado. A grama é verde e com orvalhos... Parece que tem chovido, pois também estou usando um sobretudo ao melhor estilo detetive e conforme vou andando percebo que meus sapatos estão ficando molhados por causa de um orvalho ou outro colhido aqui e ali. Minha respiração é calma e o caminhar também. Não parece que estou com pressa.
            Depois de andar por um tempo nesse campo gramado debaixo de um céu nublado e quase prateado, eu começo a perceber que uma neblina está aparecendo e ficando cada vez mais densa. Não se tem muito para enxergar, mas continuo minha caminhada como se nada estivesse acontecendo, apenas fecho melhor o sobretudo e continuo andando. Depois de alguns passos longos, começo a olhar para os lados. Não com cara de perdido nem apreensivo, mas um olhar quase que determinado, como se procurasse alguém com quem marquei de me encontrar e conforme vou caminhando e olhando para os lados, começam a aparecer lápides, tumbas e mausoléus no caminho. Claramente estou em um cemitério e caminho sob o olhar protetor de anjos e divindades e acima de lágrimas de tristeza.
            O gramado vez ou outra cede espaço para uma pedra aqui e outra acolá, como se o cascalho já tivesse sido tomado pela grama negligenciada. Eu continuo procurando e dessa vez olho as lápides com maior cuidado, lendo seu conteúdo. Cruzo caminhos com famílias diversas e vejo o rosto de muitas pessoas desconhecidas, mas continuo procurando na estrada de lágrimas antigas e novas até que parece que acho o que estava procurando. Vejo uma lápide um pouco mais solitária em meio as outras. Uma lápide em forma de cruz e um pouco mais trabalhada, mas ainda assim rachada e com musgo. A sua frente, vejo uma cova aberta e lá dentro um caixão fechado e muito bonito. Tudo está confuso enquanto assisto a mim mesmo durante tal empreitada, é apenas um sonho e seu sentido é abstrato, mas meu coração acelera consideravelmente ao ver o nome na lápide.
            O meu nome.
            E eu assisto a mim mesmo lamentando sobre meu corpo, morto a sabe-se lá quanto tempo. Também vejo meu eu vivo como se conversasse com meu eu morto e seu tom é de escárnio, as vezes ódio e de vez em quando tristeza. Mas ele discorre sobre que rumo tomamos. Por que tomou as decisões que tomou? Qual foi o sentido de sua vida no fim das contas? O que você fez de significante? Por que ninguém importante para nós apareceu lá? Ele faz as perguntas e as vezes ele mesmo tem a resposta, mas mesmo assim não as entende como tal. No fim das contas ele fica quieto e sonda a minha cova. Nossa cova. Ele cospe nela e olha para mim, o espectador solitário e silencioso desse tempo todo, e lança a pergunta:
            - O que diabos você tem feito? - Seu olhar é penetrante e repreensor.
            Fico com medo por não saber a resposta.

"Vejo uma lápide um pouco mais solitária em meio as outras."

quarta-feira, 17 de julho de 2013

L(s)er


            A palavra é uma dádiva por si só. O poder de expressar seu sentimentos em sons interpretados de forma coerente (ou não) pelos cérebros alheios é algo simples, porém impressionante. Mas a palavra é uma fonte de poder maior ainda se esta for escrita, passada para um papel, parede, rocha ou o que quer que seja o material. A palavra escrita é a maior invenção da humanidade.
            Eu gostaria de poder dizer no começo deste texto que todo ser humano pode e gosta de ler, mas por questões sociais absurdas isso não é verdade. Depois de rabiscar desenhos incoerentes em folhas em branco, aprender a amontoar blocos e quebrar brinquedos, ler é a primeira coisa que um ser humano aprende. Você desde muito jovem precisa aprender a ler e escrever para poder expressar e compreender o poder da palavra passado pelas gerações. As palavras escritas são como os ingredientes para um feitiço que, quando bem elaborado e misturado causa efeitos diversos nas imaginações de quem o interpretar.
            Eu sinceramente não compreendo como certas pessoas podem dizer que “Não gostam de ler”. Como isso é possível? Pelos meus poucos anos de vivência entre a raça humana eu posso confirmar uma coisa: Muitos gostariam de ser outra coisa. Desde um motorista de ônibus querendo ser engenheiro, até aquele garoto recluso que adoraria ser um super-herói ou capitão de uma nave espacial. Certos desejos e vontades são impossíveis, mas o imaginário coletivo e a capacidade de transcrever sentimentos em escrita torna esses desejos possíveis! Não me considero um devorador de livros como certas pessoas que conheço, mas já li bons volumes para poder falar a respeito de autores e estórias e devo afirmar que foram as melhores experiências que tive sozinho!
            Considerando este tema todo, posso dizer que já fui muitas coisas nessa vida. Certa vez fui um cavaleiro. Um reino estava em guerra e eu fazia parte daquilo tudo. Quando nesse papel, eu podia sentir, no virar de páginas, a emoção de batalhas! Juro que em certas batalhas das muitas lutadas eu podia ouvir os gritos de homens que morriam, os gritos de vitória, os gritos de comando e o estrondo de escudos se chocando. Posso afirmar que já comandei uma equipe de lanceiros iguais a mim e posso jurar pelos deuses que acreditei que aqueles eram como irmãos ao meu lado. Poderia recontar guerras, feitos heróicos, traições, invejas e erros de conterrâneos e invasores do reino e, pelos deuses, posso até descrever meu casamento com a mais bela princesa daquela terra.
            É graças a palavra escrita que também posso dizer aqui, escrevendo, que já fui um detetive. Me diga: quantos detetives vocês conhecem? Eu pessoalmente não conheço um sequer, mas posso afirmar que fui um muito diferente de todos. Este detetive vinha de um mundo onde se podia transitar entre o planeta Terra e a Lua. A missão que fiz parte envolvia o assassinato sangrento de um figurão nas mãos de androides, réplicas quase perfeitas de um humano. Eu encontrei repórteres gostosonas (e tive um caso com uma), clones encomendados por megacorporações, assassinos enviados pela mesma para impedir minha investigação e até aprendi um pouco de astrofísica enquanto estava no trabalho. Como toda boa estória de detetive durão, ela não acabou bem. Mas foi uma grande experiência que me deu a vontade de partir para outras.
            Um livro na mão é como um mundo inteiro encadernado em couro ou papelão barato. É um mundo inteiro que você leva por aí. São pessoas novas que você conhece profundamente sem nunca ouvir as vozes delas... E o mais interessante, é que ao mesmo tempo que você passa por estas experiências sozinho, você pode conhecer pessoas que compartilham da mesma, mesmo nunca estando lá com você! E, se a aventura for boa de verdade, tenho certeza que será um prazer conversar sobre ela durante muitos anos com as pessoas que também a viveram.
            Se depois de tudo isso que foi escrito aqui, usando a magia das palavras, você não tem vontade de sair daí e ler um livro e ser alguém diferente de si... Por favor, me explique como é possível você não gostar de experiências fantásticas como estas descritas.

"[...] posso dizer que já fui muitas coisas nessa vida."