O "Café do Geléia", fundado por Giovanni Di PaZZo, começou como um pequeno café na esquina da rua Orlontis com a rua Coronel Verde. Servindo apenas poucas variações do simples café o lugar foi ganhando fama devido ao seu ambiente altamente aconchegante contendo fotos de viagens feitas pelo "Geléia" (apelido carinhoso de Giovanni), relíquias e artefatos adquiridos em suas diversas aventuras pelo mundo em busca do melhor café que existia. Certo ano, Giovanni conseguiu por métodos misteriosos o melhor café que os que ali passavam já haviam provado e começou a plantá-lo e serví-lo em seu pouco famoso "Café do Geléia". O lugar ganhou fama pelo seu café fabuloso e pelo ambiente que sugeria um conto de histórias entre amigos. Agora vivemos estas histórias... Bem vindos ao "Café do Geléia".

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Gordo


            Comida. Todos gostam de comer. Eu conheço pessoas que não gostam, mas eu sinceramente acredito que elas ou estão mentindo ou elas estão mortas, muito mortas por dentro. Uma coisa que comida faz com você é te engordar um pouco ou muito, dependendo do quanto se gosta de comer ou do quanto o seu corpo coopera com o seu metabolismo. No fundo, todos temos um pouco de espírito de gordo.
            O Café do Geléia é um lugar gordo. Geléia é gordo, o Artista é gordo, o Conde é gordo e aquelas crianças, se não se controlarem com besteiras serão bons gordos também. O Artista estava em uma mesa com o Conde e os dois conversavam dividindo cafés e churros quando perceberam Helen sorrindo com um vídeo postado na internet. Helen, diferente dos outros, era magra e uma pessoa que prezava pela sua “boa forma”. O Artista gostava dela e conseguia levar altos papos com a mulher mas, sinceramente, as vezes desprezava boa parte de seu pensamento sobre manter a forma.
            Helen era o tipo de mulher que controlava direitinho tudo o que comia. Pesava com os olhos e com a mente o seu prato em restaurantes self-service, lia a parte de trás de todas as embalagens para se certificar que as informações nutricionais batiam com sua atual dieta (sujeita a mudança conforme novas notícias sobre boa forma saíam em revistas) e acordava mais cedo pelo menos quatro vezes por semana para correr no parque. Reclamava quando engordava um quilo e, quando emagrecia o mesmo ou mais, comemorava como se um parente tivesse sido curado de câncer. Era uma pessoa legal, mas muito guiada pela sociedade em relação a seu corpo e saúde.
            O Artista se levantou para ver do que a amiga estava rindo. Geléia e o Conde se aproximaram também. Helen estava vendo um vídeo sobre uma menina que tinha o seguinte projeto para sua própria vida: “Ficar gostosa”.
            - Que porcaria é essa? – Perguntou o Artista apontando com desdém a tela do computador.
            - Ah, essa menina é o máximo! Ela está emagrecendo. Já está se sentindo super bem consigo mesma e sorri bem mais. Está muito mais feliz. – Disse Helen, orgulhosa da garota.
            O Artista ficou furioso. Sua cabeça começou a rodopiar com ideias e palavras.
- O que diabos significa “ficar gostosa”? Ao meu ver, ser gostosa varia de mulher para mulher, cada uma com seu jeito, cada uma com suas qualidades e cada uma com seus charmes. A sociedade impõe a ideia de que mulher gostosa é mulher magra com uma bunda grandinha e seios fartos e isso acaba com a auto-estima de qualquer uma que esteja fora dos padrões, forçando-as a fazer dietas absurdas e tomar rumos de vida que elas mesmas não querem só para não serem “mal vistas” pelas colegas de trabalho ou amigas na escola.
Helen olhou impressionada para o rapaz. O conde fechou os olhos, cruzou os braços e concordou de forma imponente.
- Além disso – Começou o aristocrata – Ela está mais feliz? Então todo gordo é infeliz, minha cara? Ora, veja bem, gordos outrora eram vistos como símbolos de fartura, sucesso e virilidade! E eu e meus amigos gordos aqui? Não somos felizes? Parece que para este mundo cruel e corruptível não somos nada além de escória e piada de maus gosto! – O Conde começava a se exaltar.
            - Mas, gente! Ser gordo não é legal! – Helen foi fuzilada com olhares de reprovação. – Eu gosto muito de vocês, meninos... Mas vocês não são saudáveis, né! Colesterol alto, pressão alta, não conseguem correr... Isso e outras coisas...
            Geléia suspirou. O Artista, massageando os olhos disse:
            - Helen... Eu sou gordo. Eu peso exatos 112 quilos. Sim, eu não corro, mas também não quero ser maratonista. Meu coração está em perfeito estado, minha pressão arterial está normal e eu não tenho colesterol alto e mais nenhum problema. Mas, de acordo com o que você está falando eu sou infeliz e totalmente não-saudável...
            Helen ficou sem palavras. Pegou seu laptop e começou a se levantar.
            - Certo... Talvez não hoje, mas um dia vocês podem se arrepender desse estilo de vida...
            E a garota saiu pela porta da frente, deixando em uma mesa apenas os seus colegas gordos. Dois deles nervosos.

            Depois o Artista começou a concluir:
            - Talvez um dia eu fique mal, sim...
            Geléia interveio:
            - Acho que o importante é ser feliz e saudável... Gordo ou não.
            - E acho que ser feliz já é saúde o suficiente. Eu não me sentiria bem controlando o que como e bebo. E eu com certeza não me sentiria bem fazendo exercícios... Eles me irritam.
            - Serei gordo, farto e feliz enquanto minha vida e minha riqueza permitirem! – Bradou o Conde.
            Geléia se levantou rindo e voltou ao trabalho. O Artista disse com um sorriso orgulhoso:
            - Um dia eu vou morrer. Melhor morrer gordo do que viver magro!
            E tomou um longo gole de refrigerante.

"O Artista ficou furioso. Sua cabeça começou a rodopiar com ideias e palavras."