O "Café do Geléia", fundado por Giovanni Di PaZZo, começou como um pequeno café na esquina da rua Orlontis com a rua Coronel Verde. Servindo apenas poucas variações do simples café o lugar foi ganhando fama devido ao seu ambiente altamente aconchegante contendo fotos de viagens feitas pelo "Geléia" (apelido carinhoso de Giovanni), relíquias e artefatos adquiridos em suas diversas aventuras pelo mundo em busca do melhor café que existia. Certo ano, Giovanni conseguiu por métodos misteriosos o melhor café que os que ali passavam já haviam provado e começou a plantá-lo e serví-lo em seu pouco famoso "Café do Geléia". O lugar ganhou fama pelo seu café fabuloso e pelo ambiente que sugeria um conto de histórias entre amigos. Agora vivemos estas histórias... Bem vindos ao "Café do Geléia".

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Um Presente Muito Especial


O Café do Geléia também servia almoço, não todo dia, é claro, mas apenas em ocasiões especiais. Aquele era um típico dia 29, e como manda a antiga tradição, era data de comer nhoque. Ou gnocchi, como preferir.
            Todos os habituais clientes estavam presentes, a Cineasta, o Conde, o Gótico, dentre outros, aguardando ansiosamente a chegada da massa ao bufê. O Menino Ottis já havia amarrado um pano ao pescoço, para não sujar a camiseta. A refeição foi servida e estava realmente deliciosa, encheu os clientes de satisfação (menos o Gótico, que gemia a cada garfada), afinal, nada como ser bem recebido em um lugar tão diferente de onde você cresceu. Obviamente, nenhum deles era daquele lugar. O Café era notório por ser um refúgio para almas errantes, e muitas vezes, as pessoas que se conheceram e se identificaram em uma noite jamais voltariam a se ver. Nesse clima de aconchego e distância, enquanto todos conversavam, ouviu-se um lamento abafado.
            Não é incomum que alguns se emocionem naquele ambiente, mas não em um dia como esse, por isso, todos se entreolharam buscando encontrar a alma que sofria. No canto do Café, estava o Caixeiro, fitando suas botas com a cabeça baixa. Ao ser questionado sobre o motivo de sua lamentação, o Caixeiro relembrou, com um sorriso nostálgico, as épocas em que rodava as estradas de ferro vendendo mercadorias exóticas. Contou sobre o café de sua cidade natal, o Madigans, e das lindas mulheres que lá freqüentavam. Contou também sobre a infância de outrora e as amizades que a construíram com as mãos inocentes e aventurescas de filhos de artesãos e mercadores.
            A Cineasta jurou entender o que o Caixeiro sentia, mas o velho homem protestou dizendo que o que lhe afligia era diferente, ele não se encaixava mais no mundo. Suas botas artesanais, de couro claro e bem lustradas, já não eram mais objeto de inveja dos outros homens. Em que outro lugar ele poderia recomeçar, a quantos quilômetros dali estaria outra pessoa que poderia entendê-lo? Ninguém sabia o que dizer para o Caixeiro.
            Contou que viajava de trem de vez em quando, tentando se sentir vivo e ativo outra vez; disse, com risadas, que seu momento de maior glória na semana era tomar a insulina para diabetes. Em meio a tantas histórias de uma alma que já não era mais a mesma ele ganhou amigos que durariam uma noite, mas estariam sempre em uma memória tão boa quanto as velhas botas artesanais que tanto caminharam.
Aos poucos, o salão foi se esvaziando, até que só restava o Geléia limpando as mesas e observando as próprias memórias que decoravam a parede. Estranhamente, ninguém viu o velho homem sair.

            Algum tem depois o Menino Ottis relembrou o episódio:
            - O que aconteceu com o Caixeiro, afinal?
            - Não sei ao certo, mas outro dia um homem a cavalo me deixou um pacote...
            - E o que tinha nele?
            - Um presente muito especial... – disse Geléia, olhando para seus pés.

"Suas botas artesanais, de couro claro e bem lustradas, já não eram mais objeto de inveja dos outros homens."

Este texto é um presente muito especial de Walter Neto. Obrigado.

3 comentários:

Júlia disse...

sen-sa-ci-o-nal!

(espero ter separado corretamente)

reddragonilustrações disse...

muito bom

NeveZ disse...

RapaZes, muito bom!!! Puta que la mierda, hein!?