- Eu não acredito que você ainda guarda esse monte de tralha, Geléia!
A mulher de cabelos negros e encaracolados olhava ao seu redor com um misto de confusão e de maravilha. A sala era apertada, mas parecia que se todas aquelas coisas saíssem de lá, daria para abrir um salão de dança.
- É, eu não sei nem por onde começar a arrumar isso... – disse Geléia coçando a nuca e escondendo uma singela verdade.
- Você não quer se livrar disso, né? – perguntou Helen, olhando no fundo dos olhos de Geléia e revelando o que ele escondia. Ele só conseguiu dar de ombros com uma cara encabulada.
Helen sempre foi boa em descobrir as coisas. Ela teria se dado muito bem como detetive, investigadora forense, historiadora e esse tipo de coisa que só é empolgante em filmes e seriados.
- Um cubo mágico, brinquedos, um monociclo, papéis, propagandas de duas décadas atrás, papéis, uma televisão, um telejogo... Deuses... você já fuçou aqui de verdade? Digo, de verdade mesmo? – ela estava sentada se soterrando nas tralhas em que mexia.
- Eu entro aqui de vez em quando. Aliás, preciso trocar essa lâmpada aqui. – Geléia pareceu subitamente interessado em uma das lâmpadas que iluminava o quartinho. Estranhamente isso o fez lembrar de quando ele e Helen brincavam de cabaninha na casa da avó dela. Eles tinham cerca de seis anos na época e era sempre ele que tinha que montar a cabana enquanto Helen a forrava com coisas incrivelmente úteis como um controle remoto sem pilha, bonecas velhas, uma escumadeira, duas panelas – que eram usadas como capacetes ou banquinhos – e mais esse tipo de coisa.
- Lembra de quando a gente brincava de cabaninha na casa da minha avó, Geléia?
E esse era quase um super-poder dela: ler a mente de Geléia.
- Claro! Depois de colocar a casa toda dentro da cabana, você se cansava e queria parar de brincar!
- É, não tinha muito mais o que fazer ali!
Helen tinha acabado de voltar de viagem. Suas malas ainda estavam atrás do balcão e eram muito pequenas, o que era estranho para alguém que ficou seis anos fora do país. No início havia saído para estudar russo, mas parou no meio e resolveu sair vagando pela Ásia. Ela simplesmente não parava, nunca havia ficado parada em lugar nenhum. Era do tipo de pessoa que vivia viajando sem ter nenhuma fonte de renda, vivia o tipo de vida que só quem vive entende. Geléia estava louco para saber de sua vida fora, mas sabia que perguntar era inútil. Ela falaria dali a alguns minutos, quando eles parassem um pouco e um silêncio fizesse menção de aparecer.
- Aliás, não tem mais o que fazer aqui. Quer um café, Geléia?
- Eu não tomo mais café, mas aceito um chá!
Então os dois saíram do quarto e foram para o balcão, onde o Menino Ottis fingia ser o atendente e mantinha uma discussão fervorosa com Diego sobre os benefícios do refrigerante no crescimento de uma pessoa.
A luz foi apagada atrás deles e algo terrível no meio daquela bagunça acordava depois de um longo sono.
"Aliás, não tem mais o que fazer aqui. Quer um café, Geléia?" |
Texto enviado por Ricardo Pedroni (Elkreme)
2 comentários:
VAI TER MONSTRINHO MANOOO!!!
Ah, mano!!! Cadê o Terrível!? Cadê!?!?
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