O "Café do Geléia", fundado por Giovanni Di PaZZo, começou como um pequeno café na esquina da rua Orlontis com a rua Coronel Verde. Servindo apenas poucas variações do simples café o lugar foi ganhando fama devido ao seu ambiente altamente aconchegante contendo fotos de viagens feitas pelo "Geléia" (apelido carinhoso de Giovanni), relíquias e artefatos adquiridos em suas diversas aventuras pelo mundo em busca do melhor café que existia. Certo ano, Giovanni conseguiu por métodos misteriosos o melhor café que os que ali passavam já haviam provado e começou a plantá-lo e serví-lo em seu pouco famoso "Café do Geléia". O lugar ganhou fama pelo seu café fabuloso e pelo ambiente que sugeria um conto de histórias entre amigos. Agora vivemos estas histórias... Bem vindos ao "Café do Geléia".

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Simples


            Era noite. Naquele momento, o café estava quase vazio. O Gótico estava em um canto encostado na janela e o Artista estava no outro canto do estabelecimento, coberto com a própria jaqueta e roncando sonoramente. Geléia estava vendo algum seriado, sem muito interesse, em um volume baixo para não atrapalhar os dois únicos clientes daquela hora. Passado um tempo, o gerente decidiu ir ao Jukebox.
            Ele olhava para os clássicos que ali viviam a tocar. O bom e velho jazz estava sempre por lá encantando sua visão no painel. Apertou uma combinação qualquer e a música começou com seus saxofones e o piano. O piano sempre foi o instrumento que fazia aquele homem gordo sorrir e parar por alguns minutos em sua poltrona apenas ouvindo um pouco da boa música enquanto o mundo rodava sem ele perceber. Sem ele querer perceber, pelo menos. Em meio a um solo suave de sax Geléia ouviu o sino da porta tocando e logo olhou para trás, se deparando com um rapaz jovem e agasalhado entrando com um rosto pesado em seu estabelecimento.
            Geléia deixou a música tocando e se dirigiu para trás do balcão onde o homem estava indo se sentar. A música era leve como os movimentos do rapaz. Carregando uma maleta em uma das mãos, ele retirou seu cachecol e o colocou sobre o balcão, no banquinho ao lado deixou seu casaco e maleta, revelando uma blusa chique com gola role.
            - Boa noite, senhor. Posso serví-lo esta noite?
            O rapaz passou a mão na blusa para retirar alguns fiapos, depois olhou para o gerente e, sorrindo, respondeu:
            - Eu gostaria de um copo de seu café gelado, por favor.
            - É pra já. – Respondeu o calmo gerente.
            Os intrumentos tocando faziam um excelente ambiente. De alguma maneira, o saxofone e o baixo relaxante pareciam dar um tom sépia ao local para onde o rapaz olhava. Um sorriso inconsciente lhe veio ao rosto ao ver que o jukebox estava ligado em uma música tão calma e ao mesmo tempo a TV revelava um noticiário que, muito provavelmente, mostrava uma desgraça ou outra.
            - É um ótimo lugar que tem aqui, senhor. – Disse finalmente.
            - Ora, obrigado. Fico feliz que os clientes gostem. É o que tenho de mais valioso em minha vida.
            O rapaz continuava a olhar em volta e o piano parecia que queria criar a trilha sonora para cada foto e decoração que enfeitava aquele local aconchegante. Geléia chegou com o pedido do moço que logo se voltou para o balcão, agradecendo. Dado um tempo e algumas notas, saltou uma pergunta:
            - É sempre assim parado por aqui?
            - Nem sempre. Hoje parece ser exceção. Mas gosto de dias assim, sabe? Parece que o mundo não existe, por mais que seja por alguns minutos de uma musica.
            O homem concordou com a cabeça e deu uma risada.
            - São bons os dias assim. - Deu um gole em seu café. – Sabe... Eu não entendo como pudemos tornar o mundo um local tão agitado. A apenas uma geração atrás tudo parecia tão mais calmo... E hoje em dia todos dizem não ter tempo para nada!
            - Sim, nunca entendi isso também. É por isso que mantenho este lugar como ele é. Simples.
            - Simples. Acho que esta é uma palavra não muito aceita nos vocabulários modernos. – Bebeu mais café. – Nós trabalhamos até nos exaurir. Mal temos tempo para nossas mulheres. Mal temos tempo para filhos por que tudo que queremos é fazer de tudo para não perder nada de nossas próprias vidas com o intuito de ganhar mais dinheiro para ter mais coisas que nunca vamos aproveitar...
            O café era aconchegante e o ambiente fez o homem fechar os olhos por um segundo. Estava falando mais do que o normal. Havia trabalhado até tarde a semana inteira e não teve tempo para coisa alguma e agora parecia que finalmente estava aproveitando o que mais gostava de fazer na vida. Ouvir um bom som e parar por alguns segundos.
            - Por isso estão todos estressados e desrespeitosos ultimamente... – Disse por fim.

            Geléia olhou para o homem com um sorriso e disse:
            - Pois é. Parece que as pessoas esqueceram que tudo o que você precisa é de um bom café em uma poltrona ao som de jazz. O mundo, às vezes, simplesmente não precisa existir.

"O café era aconchegante e o ambiente fez o homem fechar os olhos por um segundo."

3 comentários:

Garga disse...

Cara, animal. E a mais puradas verdades, não é mesmo?

Ly disse...

"O mundo, às vezes, simplesmente não precisa existir."

Total verdade que quase mais ninguem consegue ver.

(Passei tanto tempo sem vir aqui que tinha me esquecido o quão mágico os seus textos são <3 que saudade!)

Bino disse...

É...nada como um bom jazz, uma poltrona e a mente vazia...