O "Café do Geléia", fundado por Giovanni Di PaZZo, começou como um pequeno café na esquina da rua Orlontis com a rua Coronel Verde. Servindo apenas poucas variações do simples café o lugar foi ganhando fama devido ao seu ambiente altamente aconchegante contendo fotos de viagens feitas pelo "Geléia" (apelido carinhoso de Giovanni), relíquias e artefatos adquiridos em suas diversas aventuras pelo mundo em busca do melhor café que existia. Certo ano, Giovanni conseguiu por métodos misteriosos o melhor café que os que ali passavam já haviam provado e começou a plantá-lo e serví-lo em seu pouco famoso "Café do Geléia". O lugar ganhou fama pelo seu café fabuloso e pelo ambiente que sugeria um conto de histórias entre amigos. Agora vivemos estas histórias... Bem vindos ao "Café do Geléia".

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

É tudo um jogo


            Todos já tiveram contato com jogos de tabuleiro. Eles estão em nossa cultura faz gerações e quando o ser humano atinge uma certa idade, ele joga jogos de tabuleiro. Desde “Detetive”, “Jogo da Vida” e “Banco Imobiliário” até os jogos mais obscuros que só se consegue importando. Mas os clássicos nunca morrem e não importa que jogo esteja sendo jogado pela maioria, sempre há alguém jogando xadrez.
            Era uma noite calma e a temperatura era agradável para se tomar um café no bom e velho estabelecimento. O local estava movimentado e como era de costume naquele dia da semana, as pessoas estavam jogando jogos de tabuleiro. O Artista estava jogando “Perfil” com a Cineasta. Diego, Ernesto e Tremoço estavam jogando “Banco Imobiliário” e Ernesto estava ficando muito nervoso. Menino Ottis, K.D., Thelma e Gregório estavam jogando um jogo que parecia complicado por conter miniaturas e mapas. Todos estavam fazendo algo do tipo enquanto apreciavam suas bebidas, menos o Viajante.
            Ultimamente todos perceberam que sua Bagagem Emocional estava maior e o homem agora custava a levá-la de cá para lá. Ele estava ali parado bebendo seu café preto quando viu um velho em um canto remoto do estabelecimento, sentado e com um sorriso estampado no rosto enquanto olhava para um tabuleiro de xadrez montado à sua frente. O Viajante viu o que todos estavam fazendo e, vendo que o velho estava tão quieto quanto ele, decidiu se aproximar.
            - Boa noite, senhor. – Arriscou.
            O Velho levantou o rosto para que o Viajante visse seu semblante por debaixo do chapéu.
            - Sim, meu jovem? – Ele disse abrindo de leve os olhos.
            A pele negra do homem tinha rugas que lhe davam um ar centenário. E o cabelo branco era impecável e da exata mesma cor de sua roupa.
            - Se importa se eu jogar uma partida com o senhor? – Perguntou o Viajante se apoiando na cadeira.
            - Sim, por favor. Sente-se.
            Ele se sentou e se ajeitou. Começou a olhar o tabuleiro enquanto ao fundo de sua visão o velho se voltava lentamente para a mesa e trazia a cadeira mais para perto. Seu sorriso não sumia. Os dois ficaram se olhando até que o velho gesticulou para o homem.
            - O desafiante começa. Por favor, jovem.
            O Viajante foi tocar em sua primeira peça, o Cavalo, quando o velho o interrompeu:
            - Tome seu tempo, garoto.
            Mas ele já havia pensado em sua jogada e mexeu sua peça. O Velho o fez com a exata mesma rapidez e o jogo assim se seguiu. Talvez pela inexperiência do Viajante, ou talvez pelo conhecimento do senhor sobre o jogo, ele perdeu e ali ficou olhando o tabuleiro tentando entender onde ele errou.
            - Você é bom, senhor.
            O senhor começou a ajeitar as peças e deu uma leve risada com a voz rouca, digna de um cantor de blues.
            - Quer tornar o jogo mais interessante? – Perguntou o velho enquanto ajeitava o Rei.
            - O que tem em mente?
            - Você não terá nada a perder além do jogo. Mas se ganhar de mim eu te dou algo de muito valor.
            - E isso seria?
            - Algo de muito valor. Acredite. – E abriu um sorriso levemente amarelado.
            - OK. Eu topo.
            E eles jogaram mais uma, duas, três partidas naquela mesma noite. O Viajante perdeu todas e franzia a testa a cada novo jogo enquanto o velho simplesmente sorria e dizia para ele ir com calma e pensar em seus próximos movimentos. Quando já estava tarde o Viajante se retirou e o velho continuou por lá com seu sorriso e o tabuleiro sempre montado à sua frente.
            Toda semana o jovem ia até o Café com o intuito de jogar com o velho e toda semana ele perdia. Ele praticou e praticou jogando sozinho e com outras pessoas, mas ele sempre perdia do Velho. Começou a vir mais vezes ao longo da semana, cada vez mais determinado a ganhar ao menos um jogo. Todos perceberam duas coisas nesse tempo todo: Uma era que a cadeira à frente do velho nunca era tomada por ninguém além do Viajante, outra era que a Bagagem parecia cada vez mais leve.
            Foi em um fim de tarde muito bonito e sob um céu laranja flamejante que o maior jogo aconteceu. O Viajante veio com a determinação de sempre, disposto a derrotar o Velho e se sentou na cadeira, fitando o tabuleiro grande que se estendia a sua frente.
            - Lembre-se: sem pressa. Pense em seus movimentos.
            O Viajante concordou com a cabeça e começou mexendo sua primeira peça. A partida estava acirrada, peça atrás de peça era tomada pelos dois jogadores e a partida se estendeu e se estendeu até o sol dar espaço a lua para ela ascender cada vez mais. As pessoas começaram a se reunir em volta da mesa para ver as jogadas até que... Xeque-Mate! O Viajante havia conseguido!
            -... Ganhei? Rá! Ganhei! ...não acredito... – Se esparramou na cadeira.
            O Velho gargalhou e disse aos risos:
            - Sim, você ganhou, meu jovem e como prometido eu lhe daria algo de valor.
            O senhor colocou a mão no bolso da camisa e de lá tirou uma moeda e a deu ao Viajante que a olhou incrédulo.
            - Uma moeda? – Era uma moeda de cobre tão velha quanto a humanidade. Não tinha um valor escrito e o rosto talhado nela era indecifrável. Ele não sabia o que fazer com aquilo, mas guardou da mesma maneira, como símbolo de uma vitória.
            - Obrigado, senhor. – Ele se levantou e pegou sua Bagagem enquanto se dirigia para fora do Café. – E a propósito, bom jogo, hein? – Sorriu. O Velho sorriu de volta.
            Ele ficou olhando a moeda enquanto se dirigia à porta e foi parado por um homem vestindo um terno muito bem cortado.
            - Com licença, meu amigo, mas não pude deixar de notar a moeda em suas mãos. Será que eu poderia dar uma olhada?
            O Viajante deixou e o homem a olhava fascinado.
            - Meu amigo. Estou disposto a lhe dar algo por ela! Veja bem, esta é a moeda que falta para eu completar uma coleção iniciada à muito tempo... E eu estaria disposto a dar algo de valor sentimental por ela. – O homem mexeu nos bolsos e tirou um simples botão branco. – Pertencia ao uniforme do meu pai que faleceu durante seu tempo de serviço no exército...
            Com espanto no rosto, o Viajante aceitou o botão e disse com um sorriso nostálgico no rosto:
            - Troco com a maior honra, senhor. Este botão era o que faltava para a coleção que comecei com meu irmão quando éramos jovens... Eu sempre quis completá-la... Obrigado. Mesmo!
            Dito isso, os dois partiram. E o Velho deu mais uma risada.

            Geléia veio ao lado do velho lhe trazendo seu café com leite e perguntou sorrindo:
            - O que fez desta vez, senhor?
            Ele sorriu e disse:
            - Eu apenas o ajudei a apreciar um jogo. Ele carregava muita mágoa e culpa consigo.
            - Rá, rá! Acho que quando focamos nossa força de vontade em algo novo, tendemos a nos esquecer de sentimentos que no fundo...
            - Só fazem peso. – Concluiu o velho
            Os dois sorriram juntos enquanto o Velho apreciava sua bebida.

"Lembre-se: sem pressa. Pense em seus movimentos."

2 comentários:

NeveZ disse...

Ótemos, John. Realmente acredito no poder do Novo.

Anônimo disse...

Acredito no poder dos Jogos!